1 – Conta-nos à quantos anos estás na Alma e como
foi a tua aventura no inicio desta vida de ultra?
R: Se a
memória não me atraiçoa, penso que estou na Alma há cerca de 25 anos. Penso que
foi na época de 92.Juntei-me à Alma por intermédio de um vizinho meu (mais velho que eu 5 anos) que costumava ir ver os jogos. Como morávamos porta com porta e toda a minha família o conhecia desde pequeno, comecei a ir com ele ver os jogos fora e em casa, entrando nos estádio fazendo-me passar por irmão mais novo. Nessa altura juntamo-nos à Alma porque era um grupo jovem com o qual nos identificamos de imediato e como também queríamos apoiar o clube, nada melhor que unirmos as nossas forças de apoio às existentes na altura.
R: Houve
vários momentos maravilhosos. Penso que na minha memória ficaram gravados dois
deles.
O
primeiro foi no ano de 1993, em que o Salgueiros se deslocou na última jornada
a Espinho. Foi um encontro entre dois aflitos. O Espinho precisava de ganhar o
jogo para se manter na primeira divisão e ao Salgueiros apenas bastava um
empate. Estivemos a perder até ao minuto 94 quando o nosso ex avançado Vinha
marcou o golo do empate. Foi indiscritível a alegria. As lágrimas de tristeza
que caiam pela face de mais adeptos tornaram-se em lágrimas de alegria. Vi
pessoas com idade para serem meus pais a chorar abraçadas a mim de tanta
alegria. Acho que foi nesse momento fiquei a compreender o porquê daquelas
pessoas gostarem tanto do Salgueiros.
Um
outro momento importante foi na época 96/97 quando o Salgueiros quase que
atingia o 5 lugar que dava acesso à Taça Uefa. Fomos a Faro a precisar de
ganhar o jogo. Estivemos a perder 1-0, acabamos por empatar, já quando estava
nos descontos, tivemos um penalti a nosso favor. O nosso médio centro Abílio,
especialista na marcação de livres e penaltis falhou e “morremos” junto à
praia. Foi o contraste da alegria descrita na experiência anterior.
Nesse
ano a Alma esteve presente em todos os estádios e com um grande número de
pessoas. Embora não tenhamos ido à Taça UEFA fica na memória a fantástica época
em termos de apoio.
3 – Como vês a forma como a comunicação social marginaliza os
grupos organizados em Portugal?
R: Infelizmente essa realidade é cada vez mais comum. Hoje em
dia basta-se ser de uma claque para ser rotulado como violento, bandido ou
drogado. Acho que a comunicação social deveria ir assistir a alguns jogos no
meio de claques como a Alma ou a Fúria para de uma vez por todas compreenderem
que nem tudo é violência e insultos. Nestes dois casos a vontade de apoiar o
clube que se ama é incrivelmente superior a qualquer tipo de insulto.
4 – Que importância tem para vocês enquanto
grupo, a realização de tifos num grupo ultra? Quais consideras ser os vossos
melhores tifos ao longo destes anos?
R: Penso que em qualquer grupo ultra as tifos, a par dos
cânticos, são os fatores diferenciadores. É através da tifos que conseguimos
passar a imagem do grupo para quem nos vê do lado de fora.
No que respeita aos melhores tifos, lembro-me de dois em dois
momentos distintos da vida do clube. A primeira delas foi nos anos 90 (o
Salgueiros estava na primeira liga) num jogo em Vidal Pinheiro contra o
Boavista. Esta tifo ocupou todo o topo do estádio onde se encontrava a Alma
Salgueirista. Cortamos tiras de plástico vermelho horizontalmente com cerca de
5 ou 6 metros de altura. Colamos as pontas essas mesmas tiras numa corda, sendo
que essa corda estava amarrada aos dois postes de iluminação do estádio. No
meio dessas tiras todas (centrado com a baliza) tínhamos um lençol com o
símbolo do Salgueiros. Quando as equipas entraram em campo, estava pessoal
junto aos postes de iluminação a puxar a corda e a fazer subir a coreografia.
A segunda tifo que me lembro foi quando o Salgueiros voltou a
ter futebol após 4 anos de interregno. Jogávamos na 2ª divisão distrital, o que
corresponde em termos práticos à 7ª divisão. No último jogo, em que carimbamos
a subida de divisão, jogamos em casa e lotamos o estádio. Estavam cerca de 5000
pessoas. Distribuímos cartolinas vermelhas e brancas e conseguimos “pintar” as
duas bancadas. Penso que nenhum clube naquela divisão tinha feito algo do
género.
5 - Sentes que existem dificuldades em passar
os valores e ideais, e incutir a tradição Ultra aos mais novos, tendo em conta
o actual panorama Ultra em que o nosso país vai vivendo?
R: Mais do que incutir ideais e tradição ultra aos mais novos,
num clube como o Salgueiros, a maior dificuldade prende-se com o surgimento de
novos jovens no nosso meio. Os poucos que vão surgindo vão sendo bem acolhidos
e aos poucos vão assimilando os ideais.
6- Como é que olhas e analisas o actual
Movimento Ultra em Portugal?
R: Na
última década surgiram inúmeros grupos designados ultra. Uns bons, outros nem
tanto, mas a verdade é que, tendo em conta os anos 90, o movimento ultra sofreu
um desenvolvimento favorável. Hoje em dia existe um enorme cuidado com as tifos
e com o merchandising dos grupos. Penso que atualmente não estamos muito atrás
dos grupos ultra de clubes europeus. O que nos falta acima de tudo é haver
maior representatividade em clubes de média dimensão.
7 - Muito se tem falado de duas questões muito importantes,
Legalização e Pyro, qual é a tua opinião em relação a ambas as questões?
R: No que respeita à legalização, penso que se houver benefícios
para os grupos organizados, não vejo mal nenhum. Penso que muitas das situações
desagradáveis que vimos muitas vezes no futebol tem de ser responsabilizadas.
Muitas delas são criadas por grupos organizados, outras não. Se a legalização
ajudar a banir estas pessoas do futebol, então que seja bem-vinda, mas se for
para a culpa continuar a morrer solteira, penso que a legalização se torna
desnecessária.
Em relação à pirotecnia, penso que deveria ser permitida e
deveria ser utilizada sob vigilância das forças policiais. Concordo com fumos
ou tochas, já não concordo com petardos ou very lights. Se houvesse um conjunto
de objetos pirotécnicos permitidos dentro dos estádios, o espetáculo nas
bancadas seria bem mais bonito e não haveria tanta perseguição.
8 – Quais os grupos que tem amizade? Tem alguma
recordação engraçada dos convívios com esses mesmos grupos?
R: A nossa maior amizade é sem sombra de dúvidas com a Fúria
Azul. Penso que, embora a 320 km de distância, temos uma forma muito idêntica
de pensar e estar no futebol.
Lembro dos tempos em que ambos os clubes estavam na 1ª
divisão e sempre que havia um Belenenses vs Salgueiros ou vice-versa, antes dos
jogos as claques organizavam uns jogos de futebol. Era um momento simplesmente
mágico. Lembro de jogar no campo de treinos do Belenenses e também da Fúria vir
jogar a um campo junto a Vidal Pinheiro. Havia sempre uma taça para o vencedor
e para o vencido. Depois desses jogos íamos almoçar juntos e depois íamos ver a
bola cada um para o seu lado da bancada. Recordo que a Alma nunca ganhou um
único jogo à Fúria.
9 – Pergunta de resposta difícil, se tivesses
que optar pelo teu grupo ser uma claque com um grande espetáculo visual, ou um
grande apoio vocal, o que escolherias?
R: Sem dúvida grande
apoio vocal!
10 - Diz-nos qual a tua opinião, no que diz
respeito á Fúria Azul enquanto grupo ultra?
R: Falar da Fúria é
falar de uma amizade com mais de 20 anos. É falar de gente boa que ama o seu
clube e que está no futebol pelos melhores motivos possíveis – apoiar. Penso
que seja esse um dos grandes fatores na amizade com a Alma. A forma como amam o
clube, o apoiam e nunca desistiram dele, mesmo nos piores momentos. Todos os
salgueiristas e em especial membros da Alma se reveem nesses valores.
Lembro-me quando o
Salgueiros acabou com o futebol profissional, num jogo em que o Belenenses se
deslocou a Penafiel, a Fúria colocou uma tarja com a seguinte frase “NÃO DEIXEM
O SALGUEIROS MORRER”. Enquanto for vivo, como salgueirista e membro da Alma,
nunca terei palavras suficientes para agradecer esse gesto. As amizades
preservam-se assim.
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